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O site El Pais Brasil publicou na noite de quarta-feira (24) matéria sobre as contradições do advogado, Frederick Wassef. Ele é dono do esconderijo de Flavio Queiroz, em Atibaia e após a prisão do ex-assessor, investigado em suposto esquema de rachadinho, o advogado, deu sucessivas entrevistas à imprensa que se contradizem

 

 

Frederick Wassef está uma pilha de nervos. Com livre trânsito nos bastidores do poder, ele se comporta ―ou se comportava― como o Sancho Pança de Jair Bolsonaro. Enquanto na frente das câmeras o presidente segue em sua luta quixotesca contra os moinhos de vento ―a “histeria” do coronavírus, os governadores, o PT, o comunismo e toda sorte de delírio―, o advogado agia fora dos holofotes para manter o controle das batalhas reais que acontecem nos tribunais. Até que a polícia bateu na porta de seu imóvel em Atibaia (SP), às seis da manhã da quinta-feira 18 de junho, e encontrou Fabrício Queiroz. O ex-policial movimentou cerca de três milhões de reais entre 2007 e 2018, segundo o Ministério Público do Rio, sob o comando do então deputado Flávio Bolsonaro, recolhendo parte dos salários de outros assessores ―fantasmas― e repassando o dinheiro para o chefe.

 

Wassef representava formalmente o senador no inquérito até o último domingo. Após umas primeiras declarações no dia da detenção, manteve um breve silêncio. Até que começou a dar sucessivas entrevistas no final de semana para alguns jornalistas. “Todos estão convictos hoje de que o Fred virou o alvo. Se bater no Fred atinge o presidente, eu e o presidente viramos uma pessoa só”, afirmou à CNN, sem explicar por que Queiroz estava na sua casa. Fez ilações, simulou mistério, falou em não antecipar estratégia de defesa. Disse que nunca falou com Queiroz, embora investigadores tenham constatado que ele estava escondido em sua casa há um ano. “Nunca telefonei para Queiroz, nunca troquei mensagem com Queiroz nem com ninguém de sua família. Isso é uma armação para incriminar o presidente”, assegurou ele ao jornal Folha de S. Paulo. Virou piada a pergunta por telefone da repórter Andrea Sadi, da TV Globo, no último sábado: “O Queiroz pulou o muro? Apareceu voando para casa do senhor?”.

 

Durante suas entrevistas ao vivo, as câmeras revelavam um homem agitado, como uma bomba prestes a explodir, apresentando versões desencontradas e confusas sobre os motivos de ter abrigado o ex-policial. Disse, por exemplo, que não sabia que Queiroz estava em sua casa no dia de sua detenção. “Soube algumas vezes que estava lá. É óbvio que tem risco [em abrigar Queiroz], mas essa é uma questão de natureza de saúde (…). Se eu permito que ali se acomodasse por proximidade ao local, por preservação, para que não ficasse exposto, não quer dizer que eu tenha tido contato ou qualquer irregularidade”, afirmou mais uma vez à CNN no domingo.

 

Depois de inúmeros rodeios, ainda tentou descolar o presidente do assunto. “Nunca, jamais, o presidente Jair Bolsonaro soube ou teve conhecimento desses atos, desses fatos. Essa é minha inteira responsabilidade. Eu omiti essas informações do presidente da República e do senador Flávio Bolsonaro”. Passou a dizer, então, que abrigou o ex-assessor por razões “humanitárias”, para que ele pudesse realizar um tratamento de saúde na região. E avisou que deixava o cargo de advogado de Flavio, informação depois confirmada pelo próprio senador, filho do presidente, em seu Twitter.

 

Se aos olhos do país Wassef se tornou mais um personagem surreal de uma surreal novela, o fato é que suas contradições podem acabar respingando no inquérito que tanto atormenta o presidente Jair Bolsonaro. Há evidências e registros de sobra da proximidade do advogado com o presidente. Um dia antes da operação policial que encontrou Queiroz em sua casa, Wassef se encontrava no Palácio do Planalto para a cerimônia de posse do novo ministro da Comunicação. Ele é conhecido por sua atuação discreta, nos bastidores, dos assuntos ligados ao presidente. Entre os mais importantes, era ele quem representava Bolsonaro nas investigações sobre o atentado a faca contra o então candidato às vésperas das eleições de 2018. Nos dias de apuração das urnas, se encontrava ao lado do atual presidente no sofá de sua casa. Fiel ao clã, acabou ganhando apelido de Anjo, que deu nome à operação da última quinta.

 

De acordo com a decisão do juiz Flávio Itabaiana Nicolau, havia uma ”rotina de ocultação do paradeiro de Queiroz que envolvia restrições em sua movimentação e em suas comunicações”. Ele era monitorado por “uma terceira pessoa” que, por sua vez, se reportava a um superior hierárquico referido como “Anjo” ―ou seja, Wassef. Chamou a atenção dos investigadores o fato de que o ex-policial recebia dinheiro de terceiros para se manter. O EL PAÍS tentou sem sucesso contactar o advogado.

 

Caso a versão do Ministério Público se confirme, Wassef mentiu em uma entrevista que concedeu em setembro de 2019 para a jornalista Andreia Sadi na Globo News. Ao ser questionado sobre o paradeiro de Queiroz, foi assertivo: “Não existe a frase o sumiço de Fabrício Queiroz. Eu não sei [onde ele se encontra], não sou advogado dele”. Depois, enfatizou que o ex-assessor havia, sim, comparecido ao Ministério Público. “Jamais deixou de comparecer a qualquer intimação ou chamada do poder público no Rio de Janeiro. Ele disse que jamais, que nunca, repassou um único centavo a Flávio Bolsonaro”, explicou.

 

No dia da detenção de Queiroz, na quinta-feira, 18, em sua live semanal no Facebook, o presidente Bolsonaro, que não é investigado no inquérito, opinou que a operação policial havia sido “espetaculosa” e tratou de explicar a presença na casa de seu advogado: “E por que estava naquela região de São Paulo? Porque é perto do hospital onde faz tratamento de câncer. Então, esse é o quadro. Da minha parte, está encerrado aí o caso Queiroz”. Wassef também adotou esse argumento, ao afirmar que Queiroz estava no local por causa da proximidade da Santa Casa de Bragança Paulista, onde o ex-policial faria o tratamento para um câncer de próstata.

 

De acordo com o advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, conhecido por defender várias pessoas do universo político em processos criminais, todas essas declarações desencontradas podem trazer mais “complicações” no âmbito do inquérito. “Há uma pergunta óbvia. Por que Queiroz estava lá [na casa de Atibaia], quem efetivamente o protegeu e quem pagou por aquilo. A partir do momento que ele diz que não conhecia e que agora ele diz que escondeu por razões humanitárias, isso evidentemente pode trazer algumas complicações”, disse ao EL PAÍS.

 

Suas declarações já começam a causar estragos aos olhos do Planalto. Segundo publicou a jornalista Mônica Bergamo na Folha de S. Paulo, o presidente Bolsonaro já teria afirmado a interlocutores estar irritado com Wassef. Ainda na quinta-feira da operação policial a advogada Karina Kufa divulgou uma nota afirmando que seu escritório de advocacia é o único representante do mandatário. “Wassef não presta serviço advocatício em nenhuma ação que seja parte de Bolsonaro e não faz parte do referido escritório”. De acordo com a coluna de Bela Megale, agora o advogado pressiona o presidente para que Kufa seja demitida. Irritado ou não, Bolsonaro vem se apresentando abatido diante das câmeras e com pouco fôlego para travar suas lutas diárias. No dia que Wassef deixou de representar Flávio, o senador destacou o trabalho e a lealdade do advogado. Não há sinais, por ora, de que será jogado aos leões.

 

Fonte: El Pais Brasil

Agrônomo da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, Fernando Rati, diz que alternativas para inimizar danos incluem pulverização aérea ou terrestre; ameaças às plantações e lavouras podem prejudicar produtores rurais e comunidades locais. 

 

O Escritório no Brasil da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, FAO, está acompanhando a movimentação de uma invasão de gafanhotos do deserto, que ocorre no país vizinho, a Argentina. 

 

Segundo a mídia local, as nuvens estão se formando rapidamente e podem chegar ao estado do Rio Grande do Sul, no Brasil. A ONU News conversou com o agrônomo da Unidade de Programa da FAO, em Brasília, Fernando Rati, que falou sobre as formas de responder a esse fenômeno, que tem destruído plantações inteiras em países do leste da África, como o Quênia, e em outras partes.  

 

Prevenção 

“Com relação a essa onda de gafanhotos que possa atingir o Brasil nos próximos dias e nas próximas horas, o método de prevenção mais importante nesse momento é um plano de monitoramento de como está sendo o deslocamento dos gafanhotos em tempo real. Principalmente junto às autoridades dos países Argentina e Uruguai. O Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento aqui do Brasil, liderado pela ministra Tereza Cristina, já tem uma equipe de técnicos e autoridades.”  

Na terça-feira, autoridades argentinas informaram que os gafanhotos do deserto haviam sido vistos na região de Santa Fé, a 250 km da fronteira com o Brasil. A informação foi dada pela Secretaria da Agricultura, Pecuária e Desenvolvimento Rural e o Ministério da Agricultura da Argentina a veículos da imprensa argentina. 

 

O especialista da FAO contou que com a melhor forma de combater a praga é com a pulverização aérea, e citou alguns passos tomados pelas autoridades brasileiras. 

 

Pulverizacão 

“Eles estão monitorando em tempo real esse tema. Caso a concentração dos gafanhotos atinja o Brasil o ideal é que as regiões que serão afetadas, elas sejam notificadas com um determinado tempo hábil para tomar as devidas precauções. Sobre os métodos que nós temos hoje para o controle dos gafanhotos nós enxergamos os dois que têm a ver com a pulverização: o primeiro é a pulverização terrestre, utilizamos pulverizadores só que com otimizador em faixas que é mais efetivo. A pulverização aérea, por aviões, é mais eficiente que a terrestre."

 

De acordo com Fernando Rati, lidar com gafanhotos requer muita atenção fitossanitária.  

 

Ele destacou que é muito importante consultar o melhor ingrediente ativo a ser utilizado nesse controle e tomar cuidados com todos os seres vivos na área a ser pulverizada como acontece em outros países que passam pela invasão. 

 

Na Argentina, produtores do norte do país estão preocupados com a ameaça de milhares de gafanhotos do deserto arrasarem plantações e pastagens. Os danos ainda não foram calculados, mas estima-se que milhares de hectares de plantações podem ser perdidos.

 

Praga  

A FAO considera o gafanhoto do deserto “a praga migratória mais destrutiva do mundo”. Uma nuvem de um quilômetro quadrado desses insetos pode consumir a mesma quantidade de alimento que 35 mil pessoas em um dia.  

 

A preocupação da agência é com uma crise humanitária que pode vir a ser gerada por tal situação. 

 

Países do leste da África como Etiópia, Somália, Eritreia, Djibuti, Quênia, Sudão, Etiópia, Uganda e Sudão do Sul vivem danos causados pelo pior surto de gafanhotos do deserto em décadas. 

A situação começou em 2019 na Ásia, quando o  Iêmen, a Arábia Saudita, o Irã e parte da fronteira indo-paquistanesa viram chegar os primeiros insetos após fortes chuvas.

 

Fonte: ONU

País se alinha aos EUA contra criação de comissão de inquérito internacional sobre violência contra população negra americana

 

O Brasil se posicionou contra a criação de uma comissão de inquérito internacional para investigar abusos e violência policial contra a população negra nos Estados Unidos, durante uma reunião extraordinária do Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, na quarta-feira 17.

 

A reunião extraordinária foi convocada por 54 nações africanas para debater a discriminação e o “racismo sistêmico” nos Estados Unidos, motivadas pelo homicídio de George Floyd, homem negro morto em Minneapolis em 25 de maio, após ser pressionado contra o chão pelo joelho de um policial durante vários minutos.

 

Ao se posicionar contra, a representante da missão permanente do Brasil junto à ONU em Genebra, Maria Nazareth Farani Azevêdo, argumentou que o problema do racismo não é exclusivo de uma região específica. “É um flagelo profundamente enraizado em muitas partes do mundo, afetando grande parte da humanidade”, afirmou, acrescentando que também é importante reconhecer o “papel indispensável” das forças policiais para garantir a segurança pública.

 

As nações africanas se uniram para apresentar um projeto de resolução que pedia uma comissão de inquérito internacional (o termo é usado para graves crises de direitos humanos num país, como o conflito sírio) para investigar os acontecimentos nos EUA e em outros países em situação semelhante. Os Estados Unidos, que se retiraram do Conselho de Direitos Humanos há dois anos, pressionaram por meio de aliados pela exclusão do termo.

 

Com a falta de apoio de países de fora da África, as nações africanas acabaram convencidas por outros países a rebaixarem suas expectativas para poderem levar a proposta adiante. A decisão sobre a investigação deveria ser tomada já na quarta, mas um grande número de países solicitou intervenções no debate, o que prolongou a sessão e obrigou a presidência a estendê-la para esta quinta, quando a proposta dos africanos será votada.

 

Com a revisão do texto, o projeto já não pede mais uma comissão de inquérito internacional para a situação nos EUA nem mesmo menciona os Estados Unidos. Em termos gerais, o projeto pede agora que a alta comissária de Direitos Humanos, Michelle Bachelet, realize uma apuração para ”estabelecer os fatos e circunstâncias relacionados ao racismo sistêmico, as supostas violações do direito internacional em matéria de direitos humanos e ao mau-trato de africanos e pessoas de origem africana”.

 

Na abertura do debate, na quarta, Bachelet denunciou, sem mencionar os EUA, a “violência racial, o racismo sistêmico e as práticas policiais discriminatórias da atualidade”, que ela considerou um legado do comércio de escravos e do colonialismo. Ela afirmou ser a favor de reparações de várias formas.

 

Ao se referir a Floyd, Bachelet disse que “esse ato gratuito de brutalidade passou a simbolizar o racismo sistêmico, que prejudica milhões de pessoas de ascendência africana”. Presente no debate por meio de uma mensagem de vídeo, o irmão de George Floyd, Philonise Floyd, pediu à ONU que ajude os americanos negros com a ”criação de uma comissão independente de inquérito” sobre a violência policial. “Vocês têm o poder de nos ajudar a obter justiça”, disse.

 

O embaixador do EUA na ONU em Genebra, Andrew Bremberg, disse que seu país não está “acima de um escrutínio” em questões de discriminação racial, mas que está implementando reformas. Ele destacou o decreto assinado na terça-feira pelo presidente Donald Trump, o qual oferece incentivos financeiros aos departamentos de polícia que melhorem seus padrões de treino no uso da força. Trump tem poder limitado sobre as polícias, que são sobretudo de responsabilidade dos estados e das cidades.

 

Fonte: Geledés

Aos 69 anos, artista recorda seu movimento de transgeneridade e celebra orgulho LGBT: "Não temos vergonha do que somos".

No começo, mais de 10 anos atrás, eram as unhas pintadas que chamavam a atenção (dos outros). Mas ficou assim, sem vergonha. Não que alguém estivesse marcando tempo ou indicando que um processo começa em um dia específico, mas foi assim. Aliás, isso é uma coisa que ela deixa claro. Tudo é parte de um processo. “Não chamo de transição porque não saí de um lugar fixo para outro fixo, estou em um movimento que é mais aberto.” E ao lembrar do começo público das descobertas que viveu, mostra as unhas pela videochamada, hoje sem esmalte algum. “Agora não estou pintando. Aliás, quer que eu coloque umas coisinhas?”, pergunta, referindo-se a brincos e colares. Não há necessidade. Que fique como estiver mais à vontade. 

E assim tem sido. A cartunista Laerte Coutinho, 69 anos, se sente mais tranquila hoje. Aprendeu a conviver com o interesse da mídia quando tornou público seu processo de gênero e entende o certo frisson em torno disso. “Os passos que eu ia dando eram surpreendentes para mim mesma, eu ia aprendendo.” Essa transparência em cada nova mudança a tornou, de certa maneira, um símbolo dentro do movimento LGBT.

Ela admite, porém, que, apesar de enxergar esse reconhecimento, estranha um pouco e logo se afasta de grandes feitos ou pioneirismos. “De fato eu não acho que fui corajosa. Fiz esse movimento numa situação em que não corri muito risco, senti que não ia perder meus pontos como profissional, amizades, minha família ia continuar me amando, eu sabia que não ia correr risco. Corajosa é a pessoa que bota a coisa em jogo e se arrisca a perder tudo e muitas vezes perde”, pondera. 

Para Laerte, vieram ganhos. “Acho que a transgeneridade trouxe uma coisa muito boa que era minha já... O período anterior eu vivi situações de muita tensão e contenção. Me sentia fechada, dura, amarga. Claro que não o tempo todo, mas como um padrão era isso... Vejo minhas fotos dessa época e traduzem essa amargura, eu parecia uma pessoa que estava ficando velha, e a transgeneridade me jogou para outra coisa. Não quer dizer que eu me sinta jovem, mas eu me sinto uma pessoa mais satisfeita com a vida.”

Fez parte de uma redescoberta minha, não foi a única coisa que aconteceu, mas fez parte como sinal e símbolo dessa mudança muito importante para mim.

No meio de suas questões pessoais (que inclui a morte de um de seus filhos, em 2005, que brecou parte do movimento de transgeneridade que Laerte havia iniciado), o trabalho também foi alterado. Não bem nessa ordem.

“A mudança que imprimi no meu trabalho foi independente da transgeneridade, mas tem a ver com minha aceitação de orientação sexual. No início dos anos 2000 eu já tinha me convencido que ficar bloqueando e escondendo era um veneno que eu estava tomando todo dia e cheguei à conclusão que meu trabalho precisava mudar, estava cansada de produzir as piadas que eu vinha produzindo e mudei totalmente e foi antes da transgeneridade”, recorda-se. 

Deixou personagens, despediu-se de certos tipos de piada, se identificou com outra maneira de fazer humor. Mas, claro, nem tudo foi embora. “Mantive só a Muriel [também Hugo, que transita entre os gêneros nas tirinhas de Laerte] por causa disso, porque me interessava como um modo de pensar no que estava acontecendo comigo, porque tenho uma dificuldade de me concentrar e refletir sobre meus processos e uso meu trabalho como ferramenta para isso... Eu me auto-uso.” (risos)

ARQUIVO PESSOAL/LAERTE COUTINHO

Sobre o humor, talvez tenha a ver com a maneira de olhar para a vida como um todo. Continua conectada a essa forma de comunicação, mas com outro objetivo. “Não estou mais preocupada em produzir riso. O humor é maior do que isso; é um modo de expressão que não necessariamente conduz ao riso e isso me interessa muito. Deixei ele mais semelhante ao processo poético. Não digo que faço poesia, mas com isso trabalho em uma terra mais nebulosa, mas dúbia, [trabalhos que] levam para vários lados.”  

Atualmente, em meio ao isolamento provocado pela pandemia da covid-19, sente que há um desafio novo para produzir — e tem sofrido um pouco por não poder ver os pais, os filhos e os 4 netos. Mas sobre o trabalho, o problema não é ficar em casa, prática já recorrente para cartunistas. “Viramos bicho de toca.” Mas sim lidar com a situação como um todo.

“O que faz falta para meu desempenho profissional é disposição e energia e nesse sentido a quarentena achata isso. A gente fica desanimada, entramos em processo variados de depressão. Não estou depressiva, mas rola muita ansiedade, isso tudo não é estímulo para concluir bons trabalhos, não.”

ARQUIVO PESSOAL/LAERTE COUTINHO
Eu sinto orgulho, faço parte dessas pessoas [LGBT] que têm orgulho. Me sinto orgulhosa do meu movimento porque eu não me sinto envergonhada dele, acho que é isso. Não temos vergonha do que somos.

Além disso, Laerte pontua que muitas coisas que estão expostas hoje na sociedade também não são exatamente inspiradoras. “A pandemia deixou muito claro que estamos numa sociedade desigual, injusta e opressiva, muito cruel. Mas o que podemos aprender acho que é a ideia de que é possível parar, interromper esse processo e existem outras formas de existir em sociedade. Algumas já estavam sendo delineadas antes por pessoas que estavam ocupadíssimas em demonstrar como as populações de favela, negras, de índio, LGBT, estavam sendo massacradas, como as desigualdades de gênero são opressivas, como o meio ambiente está sendo destruído…” 

Difícil imaginar como as coisas ficarão após este momento complexo da política e da sociedade brasileira. “Acho que temos material para a gente se meter numa boa luta para reconduzir o País, reconduzir não, conduzir o País em um caminho de mais humanidade.”

Ela enxerga também crescimento do movimento LGBT, mesmo com as dificuldades e preconceitos que ainda encontram. “O movimento está amadurecendo, está firmando um padrão mais aberto de identidade de gênero que quebra o binarismo de gênero e acho isso bom. Além disso, acho que tem outros vetores se colocando nessa luta: questões de classe, étnicas, cor de pele.”

ARQUIVO PESSOAL/LAERTE COUTINHO

Parece ter esperanças com o futuro, apesar de tudo. E há motivo. Afinal, foi justamente depois de um período difícil que enxergou a possibilidade de viver de outra forma. “Essa mudança pessoal que experimentei, essa espécie de fim do ciclo de amargura para mim inaugurou uma ideia de liberdade. Eu não estava fazendo nenhum gesto de agressão a ninguém, era uma coisa totalmente amorosa em relação ao mundo, dependia só de mim. E perceber que isso era possível foi muito bom, e quando notei que além de possível eu me sentia ótima, nossa... É difícil descrever o grau de satisfação que a gente fica, é muito bom. A minha vida mudou.”

E hoje vive assim. Mais tranquila. E sem vergonha. Sem vergonha nenhuma. “Orgulho pode ser um pecado (risos), mas eu compreendo o uso da palavra orgulho como o oposto de vergonha. Então sim, eu sinto orgulho, faço parte dessas pessoas que têm orgulho. Me sinto orgulhosa do meu movimento porque eu não me sinto envergonhada dele, acho que é isso. Não temos vergonha do que somos”, conclui.

Desemprego na família e sufoco para pagar contas fazem parte da nova rotina

 

Com dois meses e meio de vigência, a MP 936, que suspende contratos e corta jornadas e salários, já atingiu quase 11 milhões de trabalhadores no país, segundo dados do Ministério da Economia.

 

Para o governo, a medida é uma forma de preservar empregos, já que os patrões se comprometem a não demitir seus funcionários por um período. Mas, para trabalhadores, o corte do salário ou a suspensão de contrato de forma inesperada em meio a uma pandemia transformou suas vidas financeiras de um dia para o outro.

 

A reportagem do Agora alterou os nomes para contar as histórias desses profissionais, que preferiram não se identificar.

 

Para muitos, a nova renda reduzida passou a ser a segurança da família, diante de demissões e da brusca queda de ganhos de quem vive na informalidade.

 

Foi o que aconteceu com Diana, 36 anos, professora de um colégio particular. Com o corte de 70% no salário, ela ainda teve que lidar com o desemprego do marido.

 

“Tivemos que mudar toda a nossa vida familiar. Reestruturamos tudo e pedimos descontos em todas as contas. Tiramos nossas filhas da escola particular e enxugamos os gastos. Foi um abalo muito grande, totalmente inesperado", relata.

 

"Sem o salário do meu marido, contamos com a complementação do BEm [Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda], mas ele tem um calendário próprio e não cai no dia em que minhas contas vencem, como acontece com meu salário. Estamos equilibrando pratos e contando cada centavo, o que é difícil quando se tem duas crianças em casa”, afirma a professora, que está trabalhando com jornada reduzida e dando aulas de casa, em regime de home office.

 

Maurício, 43, auxiliar de serviços de uma construtora, teve redução de 25% no salário e se transformou no único com renda garantida em sua casa: todos os outros familiares são autônomos e não estão conseguindo ter ganhos durante a pandemia.

 

“Está tudo bem apertado mesmo. Estou fazendo de tudo para não ter que pegar um dinheiro emprestado com o banco. Continuo trabalhando nas obras e, mesmo com a jornada reduzida, tenho medo de andar pelas ruas e ficar doente", diz.

 

"A falta de dinheiro pesa muito, principalmente no emocional. Sou a única pessoa com dinheiro mensal certo, mesmo que reduzido, em casa. Vejo meus familiares tentando de tudo para fazer uma grana, mas se está difícil para gente com CLT, imagina para quem não tem. Todos estamos abalados e tristes. Só me resta esperar os 90 dias da redução e, depois, segurar esse emprego”, relata o auxiliar de serviços.

 

Contrato suspenso

Já Carlos, 40, trabalhava como terceirizado em uma montadora e teve o contrato suspenso por dois meses. Na volta ao trabalho, foi mandado embora, mesmo com a garantia de estabilidade provisória prevista na MP.

 

“Fique dois meses recebendo quase nada e aguardando voltar ao trabalho para ter rotina financeira normal, quando foi surpreendido com a demissão. Como a MP garantia estabilidade e isso não foi cumprido, entrei com uma ação trabalhista, espero conseguir retornar ao meu trabalho", afirma.

 

"Com a suspensão, já estava complicado financeiramente aqui em casa, agora, ficou pior. Eu era o único assalariado. Não sei como vamos fazer para nos mantermos e pagar as contas, ficar desempregado neste momento é aterrorizante. Estou tentando fazer alguns bicos, mas espero que a Justiça me devolva o meu trabalho. Era o meu ganha-pão, mas também era algo que eu fazia com gosto", conta Carlos.

 

Pedro, 50, também teve o contrato suspenso. Ele, que trabalha em uma construtora civil, aguarda que, daqui 30 dias, seja reintegrado à empresa.

 

"A gente conta com o nosso salário, aquele que ficamos sabendo que vamos ganhar ao sermos contratados e fazemos nossa vida em cima disso. Por isso, foi inesperado e terrível ter que revisar todas as contas de casa quando tive o contrato suspenso. Consegui alguns descontos quando provei que estou dentro da MP, mas, mesmo assim, a conta não fecha", diz ele.

 

"Espero que a empresa garanta mesmo a estabilidade e que, depois disso, as coisas já estejam melhores. Não quero deixar minha família na mão. Na minha idade, já fica mais complicado conseguir um emprego que sustente mesmo a gente", afirma ele.

 

Prorrogação da medida foi aprovada

Os senadores aprovaram na terça-feira (16) texto enviado ao Congresso pelo Ministério da Economia que permite que o governo prorrogue a MP 936 até o fim do ano, enquanto durar a vigência do estado de calamidade pública causado pela pandemia do novo coronavírus.

 

A proposta prevê que o prazo máximo para a suspensão integral de contratos seja ampliado dos atuais dois meses para quatro meses. Já a redução proporcional de salário e jornada passaria de três meses para até quatro meses.

 

Pela proposta, seria possível combinar períodos de suspensão do contrato com redução de jornada. Agora o texto foi encaminhado para sanção do presidente da República Jair Bolsonaro.

 

A vendedora Mariana, 30, acredita que, se o projeto for sancionado, sua empresa ira aderir na hora. Ela sofreu um corte de 50% no salário e, além disso, a loja em que trabalha cortou o pagamento das comissões das vendas feitas por ela.

 

Mesmo recebendo uma parte seu salário de volta por meio do BEm, ela teve que pedir ajuda para a mãe aposentada na hora de pagar as contas mensais de sua casa.

 

“Na ponta do lápis, com a redução e o fim das comissões, tive um corte de 75% no meu salário, algo desesperador. Infelizmente, tive que pedir ajuda financeira da minha mãe ou não conseguiria pagar tudo. Meu horário de trabalho foi reduzido, mas continuo sendo cobrada como antes", conta ela.

 

"Tenho um filho pequeno e morro de medo de me locomover até a loja em que trabalho, mas não tem outro jeito. É isso ou ficar sem emprego, por seis meses estou garantida na vaga, espero que depois também. Tenho certeza que eles ampliariam a redução dos salários por mais quantos meses se fosse permitido. Para os patrões essa MP está sendo ótima, mas para nós, trabalhadores, um desafio muito dolorido", completa.

 

Garantia de emprego

A medida criada durante a crise econômica provocada pelo coronavírus autoriza, via acordos coletivos ou individuais, que empregadores reduzam jornada de trabalho e salário por até 90 dias ou suspendam contratos de trabalho por até 60 dias.

 

Em contrapartida, os trabalhadores impactados recebem uma renda do governo, o BEm. Também há garantia de estabilidade durante o período da redução ou de suspensão e, após ele, por período equivalente. Se demitir, a empresa deve pagar indenização ao trabalhador.

 

Fonte: Agora SP

Mudança pode fomentar ainda mais o endividamento e práticas abusivas contra o aposentado

 

No final do ano passado, o INSS resolveu fazer um pregão para terceirizar sua folha de pagamento a seis bancos e empresas de crédito pessoal. A medida diversifica o atendimento e gera um trocado. A autarquia estima faturar R$ 25 bilhões nos próximos cinco anos.

 

O curioso é que o instituto, pelo CNPS (Conselho Nacional de Previdência Social), sempre tomou medidas para proteger o aposentado de práticas abusivas e do assédio de instituições financeiras, a exemplo de regular a taxa de juros, o limite de crédito, o vazamento de informações sigilosas, a venda casada e, até mesmo, bloquear as insistentes ligações de oferta de empréstimo consignado.

 

Esse é um problema tão recorrente na área previdenciária que foi criado um Grupo de Trabalho Interinstitucional com a missão de proteger o cidadão e o aposentado, principalmente os mais vulneráveis, no caso dos aposentados rurais e dos que têm BPC (Benefício de Prestação Continuada).

 

Mesmo com toda essa cautela, a riqueza dessas informações financeiras e do próprio pagamento da folha será delegada às mesmas instituições que, por muitos anos, ocuparam o ranking de reclamações do Conselho Nacional.

 

É uma situação intrigante, percebida com as novas concessões de benefícios já ocorrendo nesse formato. E que nos faz remeter à fábula da “raposa cuidando do galinheiro”; frase usada para descrever o paradoxo de dois inimigos, predador e vítima, conviverem juntos.

 

Não é que o banco seja inimigo do aposentado. Pelo contrário, se depender do banco, ele se tornará o melhor amigo, principalmente aquele que empresta um dinheirinho.

 

O problema é que o brasileiro, de modo geral, não tem muita educação financeira. Considerando que cerca de 70% dos aposentados da Previdência ganham um salário mínimo, essa fatia é formada, sobretudo, por vulneráveis que não tiveram muito estudo ou orientação.

 

E esta nova intermediação financeira pode fomentar ainda mais o endividamento e práticas abusivas contra o aposentado.

 

Fonte: Agora SP

Classes mais altas reduzem consumo e as mais baixas queimam reservas, o que tende a agravar desigualdade social

 

O saldo recorde da poupança registrado em maio –R$ 921 bilhões– resulta não só do aumento do volume de depósitos, fruto do auxílio emergencial, mas também de uma queda significativa das retiradas.

 

A queda nos resgates à primeira vista é contraintuitiva, considerando a alta do desemprego e as reduções salariais, fatores que deveriam levar as famílias a usar mais suas reservas.

 

No entanto, o que parece estar ocorrendo é o movimento contrário, alimentado por uma atitude precaucionista entre as classes média e alta diante de um quadro de incerteza e volatilidade, afirmam economistas.

 

O dado reforça a avaliação de que o impacto econômico da pandemia está sendo sentido de forma heterogênea por famílias de maior e menor renda, o que pode agravar a desigualdade social.

 

Em março, quando a pandemia estourou no Brasil, o volume sacado da aplicação foi R$ 209,7 bilhões –valor 5,8% superior ao registrado em fevereiro e 14,4% maior que o observado no mesmo período do ano passado.

 

Apesar do agravamento causado pela crise do novo coronavírus desde então, o montante resgatado em abril caiu 11,8% em relação a março, para R$ 184,9 bilhões. O número é inferior mesmo ao observado em abril do ano passado (-8,2%), meses antes do início da pandemia.

 

Em maio ocorre uma recuperação parcial do volume de saques, que volta ao mesmo patamar de fevereiro, mas o montante total permanece inferior na comparação anual (-3%).

 

Há quatro vetores principais em ação que explicam esse resultado, um no sentido de aumentar os saques e três no de reduzir, analisa Martin Iglesias, especialista em investimentos do Itaú Unibanco.

 

Incentiva o aumento dos resgates a perda de renda das famílias, que se viram obrigadas a usar suas reservas. A pandemia levou a uma queda recorde de postos de trabalho –foram 4,9 milhões de vagas perdidas no trimestre encerrado em abril.

 

Por outro lado, houve também uma redução do consumo, um reordenamento da prioridade dos resgates entre diferentes aplicações e uma redução do ritmo de migração da poupança para outros investimentos, afirma Iglesias.

 

No primeiro trimestre, o consumo das famílias caiu 2% em relação aos três meses anteriores, pior resultado desde 2001, segundo dados do IBGE. O Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) projeta um tombo de 11,2% no indicador até o fim do ano.

 

Já o reordenamento das prioridades de investimento responde a um comportamento de aversão ao risco.

 

"Nós passamos por uma volatilidade muito forte no mercado. Nesse cenário, algumas pessoas optaram por resgatar os ativos de maior risco em vez da poupança", diz Iglesias.

 

Esse comportamento explica também o terceiro vetor: em vez de sair da poupança em busca de investimentos com maior retorno, como fundos multimercado –movimento que vinha crescendo nos últimos anos--, os investidores preferiram se manter numa aplicação de menor risco, ainda que de rentabilidade menor.

 

Outro fator que ajuda a entender a preferência pela poupança em detrimento de outras aplicações de renda fixa é a vantagem de tributação –os rendimentos da aplicação são isentos de Imposto de Renda, aponta Ricardo Barboza, professor colaborador do Coppead (UFRJ) que vem estudando o impacto da incerteza na economia brasileira no período recente.

 

Esse quadro não é uma exclusividade brasileira: foi visto em escala internacional com o aumento da demanda por títulos do Tesouro americano.

 

"É como se o mercado de investimento para pessoas físicas tivesse um componente contracíclico. Quando as coisas ficam mais difíceis, aquele que pode, cuja renda não caiu tanto ou não caiu, tende a segurar seus gastos e aumentar as aplicações", afirma o economista do Itaú.

 

Já José Francisco de Lima Gonçalves, economista do Banco Fator, levanta a hipótese de parte dos beneficiários do auxílio emergencial de R$ 600 não estar resgatando o dinheiro.

 

Seriam pessoas com condições de se manter com outras fontes, preferindo manter o auxílio na poupança por cautela.

 

"Quem tem renda média para cima está atrás de rendimento, não de liquidez. Então quem vai para a poupança é quem não faz aplicações mais sofisticadas", afirma.

 

Claudio Considera, do Ibre (FGV), vai na mesma linha –para ele, a queda nos resgates pode ser resultado da cautela dos beneficiários do auxílio. "Poupança é lugar de guardar dinheiro, não é de quem procura rentabilidade."

 

A evolução do nível de preços nos últimos meses, no entanto, aponta que a demanda segue em alta entre as classes mais baixas, enquanto as mais altas estão freando seu consumo.

 

De acordo com o Ipea, houve uma deflação (queda dos preços) de 0,45% na cesta de consumo das faixas de renda mais elevadas no acumulado de janeiro a maio. Já entre as faixas de renda mais baixas, ocorreu o inverso: alta de 0,45% nos preços, puxada pela demanda em alta por alimentos, principal componente da cesta de consumo da base da pirâmide.

 

"Isso significa que o salário real de quem ganha pouco está diminuindo e o de quem ganha muito está aumentando. Quem consome mais está perdendo renda, quem tem propensão menor ao consumo, aumentando. Em termos agregados isso pode representar um entrave para a recuperação, na medida em que temos dificuldade no nosso melhor motor, que é o consumo entre as camadas de renda mais baixa", diz Barboza.

 

Débora Freire, professora de economia da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), que tem pesquisado o impacto do programa de renda emergencial, destaca que a população que está recebendo o auxílio na poupança está sacando. "São pessoas que consomem a maior parte da renda e não têm reserva para poupar", diz.

 

A economista aponta que as famílias da base tendem a sofrer um impacto na renda em cenários recessivos 20% maior do que a média da população.

 

As implicações macroeconômicas das diferenças de propensão ao consumo e capacidade de poupança são um dos principais argumentos dos defensores da criação de uma renda básica universal em caráter permanente.

 

Uma das ideias para financiar o auxílio é elevar a tributação sobre as rendas mais elevadas.

 

"O que podemos dizer a priori é que o impacto dessa tributação na economia é positivo porque você vai transferir renda de uma classe que consome uma menor parte da sua renda para uma, mais ampla, que tende a consumir uma parte maior", diz Freire.

 

Fonte: Folha de SP

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